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Cachaça (Folclore)

A cachaça, aguardente feita da cana-de-açúcar, é a bebida típica do povo brasileiro. Conhecida por diversos “apelidos” como cana, caninha ou branquinha, água-que-passarinho-não-bebe, entre outros, a cachaça representa para o Brasil o que a tequilla representa para o México e a bagaceira para Portugal.
 

Cachaça (Folclore)

Artigo disponível em: ENG ESP

Última atualização: 02/08/2022

Por: Lúcia Gaspar - Bibliotecária da Fundação Joaquim Nabuco

Branquinha,
Branquinha,
é suco de cana
pouqinho – é rainha,
muitão – é tirana...

Ascenso Ferreira

A cachaça, aguardente feita da cana-de-açúcar, é a bebida típica do povo brasileiro. Conhecida por diversos “apelidos” como cana, caninha oubranquinha, água-que-passarinho-não-bebe, entre outros, a cachaça representa para o Brasil o que a tequilla representa para o México e a bagaceirapara Portugal.

Segundo Luís da Câmara Cascudo, o nome teve origem nas quintas da região do Minho, em Portugal. O nome cachaça, no entanto, não se tornou popular naquele País nem na Espanha. O registro mais antigo da palavra é do século XVI. Apareceu numa carta que um fidalgo português, Sá de Miranda (1481-1558), enviou para Antônio Pereira, senhor de Basto:

Ali não mordia a graça
Eram iguais os juízes,
Não vinha nada da praça,
Ali, da vossa cachaça!
Ali, das vossas perdizes!


Quando começou a ser fabricada no Brasil, a cachaça se constituía em uma espécie de garapa, sem nenhum teor alcoólico. Era a espuma da caldeira onde se purificava o caldo de cana em fogo lento. Servia também de alimento para animais, como jumentos, cabras e ovelhas.

Só depois da segunda metade do século XVI é que a bebida passou a ser fabricada em alambiques, que eram feitos inicialmente de barro e depois em cobre.

Antigamente, nos engenhos do Nordeste brasileiro, usava-se dar cachaça aos escravos na primeira refeição do dia, para que eles agüentassem melhor a difícil jornada que enfrentavam nos canaviais.

Diversos viajantes estrangeiros que visitaram o Brasil registraram informações sobre a fabricação da bebida, desde o século XVI, mas não usaram o termo cachaça. André João Antonil foi um dos primeiros a utilizá-lo no Brasil, na primeira década do século XVIII. No século XIX, outros viajantes como o francês Auguste de Saint-Hillaire e o inglês Henry Koster, também falaram sobre a produção da cachaça.

A bebida tornou-se nacional com os movimentos políticos a favor da independência do País. Era a preferida dos patriotas que se recusavam a beber vinhos estrangeiros, especialmente os portugueses.

Faz-se presente nas conversas de balcão das vendas e bodegas dos subúrbios e das zonas rurais brasileiras, assim como nos velórios de cidades do interior. É obrigatória, também, em festas como batizados, onde é servida misturada com mel de abelha e suco de maracujá, conhecida como “cachimbo” ou “cachimbada”.

Nas caipirinhas ou batidas, misturada com suco de frutas e gelo, ou pura, tomada com um gole rápido antes de pratos típicos da culinária brasileira, como a feijoada, por exemplo, a cachaça está presente no cotidiano do brasileiro.

Na medicina popular é utilizada, principalmente, no preparo das “garrafadas”, um remédio popular muito conhecido e utilizado pelo povo.

Em cerimônias religiosas de cultos afro-brasileiros, como o candomblé e o xangô, a cachaça é um elemento importante. Despeja-se o líquido no chão para homenagear as divindades. A cachaça é indispensável no Catimbó brasileiro. Sem ela não se faz um amuleto ou feitiço “eficiente”. No ritual indígena da pajelança, da Amazônia, umedecer os pulsos, as têmporas, a sola dos pés, a palma das mãos, a nuca e o alto da cabeça com cachaça, faz com que o indivíduo fique protegido por uma couraça impermeável por vários dias ou semanas.

A cachaça tem sido objeto de pesquisa para vários folcloristas, como Luís da Câmara Cascudo, Mário Souto Maior, Nelson Barbalho, José Calasans, o que denota a sua importância para a cultura nacional. Há diversos ditos, versos e louvações sobre a água-que-passarinho–não-bebe que vêm sendo registrados e transmitidos através das gerações, por estudiosos do tema, contribuindo para preservar a cultura popular brasileira:

A cachaça alegra os tristes.
Melhora quem está doente,
Faz aleijado correr
E cego ver de repente


Agora eu quero falar
Da saborosa cachaça,
Bebida de bom consumo
Seja no mato ou na praça,
Aos poucos traz alegria
Demais, só traz desgraça


Água de cana é cachaça
Concha pequena é colher
Língua de velha é desgraça
Bicho danado é mulher


A literatura popular em versos, mais conhecida como literatura de cordel no Brasil, possui uma grande quantidade de folhetos que têm como tema a cachaça, assim como é bastante grande o anedotário brasileiro sobre abranquinha.

Como disse Sebastião Vila Nova:

Se é inegável que a cachaça tem comprometido a saúde de muito brasileiro mal alimentado das categorias de renda inferior, por outro lado, é também inquestionável que sem ela muito edifício não teria sido erguido; muito trabalho não teria sido realizado pela gente pobre e heróica dos nossos Brasis.
 

 

 

Recife, 28 de novembro de 2005.
 

 

Fontes consultadas

BARBALHO, Nelson. Dicionário da aguardente. Recife: [CEPE], 1974.

CACHAÇA. Foto nesse texto. Disponível em: <http://ziegenhof-licoresdestilados.blogspot.com.br/2011/08/cachaca-uma-bebida-de-respeito.html>. Acesso em: 2 ago. 2016. 

CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, [19--].

______. Prelúdio da cachaça: etnografia, história e sociologia da aguardente no Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 1986.

SOUTO MAIOR, Mário. Dicionário folclórico da cachaça. Recife, 1973.

VILA NOVA, Sebastião. Cachaça, uma biografia: apresentação. Ciência & Trópico, Recife, v. 27, n. 2, p. 401-402, jul./dez. 1999.

Como citar este texto

GASPAR, Lúcia. Cachaça (Folclore). In: PESQUISA Escolar. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2005. Disponível em:https://pesquisaescolar.fundaj.gov.br/pt-br/artigo/cachaca-folclore/. Acesso em: dia mês ano. (Ex.: 6 ago. 2021.)