Música Popular Brasileira: MPB
Última atualização: 31/08/2022
A história da Música Popular Brasileira pode ser contada a partir do período colonial com a mistura de vários estilos musicais entre os séculos XVI e XVIII: cantigas populares, músicas religiosas, fanfarras militares, sons de origem africana, músicas eruditas europeias e os cantos e sons tribais dos indígenas
[...] além de melodia, harmonia e ritmo, a música popular brasileira tem poesia, conta histórias e se confunde com a história do próprio país, que por seu intermédio torna-se acessível às grandes massas da população. (CARVALHO, 2008, p. 28).
O lundu, de origem africana, com caráter sensual e batida rítmica dançante, e a modinha, de origem portuguesa, que falava de amor e exalava melancolia, que tinha uma batida calma e erudita, eram os ritmos musicais de destaque dos séculos XVIII e XIX.
O choro ou chorinho nasceu da mistura do lundu, da modinha e da dança de salão europeia na segunda metade do século XIX.
No início do século XX, começam a se misturar, nos morros e cortiços brasileiros, os batuques e rodas de capoeira com os pagodes e as batidas em homenagem aos orixás dando origem ao samba. Em 1917, Ernesto dos Santos, o Donga, compõe o primeiro samba de que se tem notícia: Pelo Telefone. Nesse mesmo ano, Pixinguinha, importante cantor e compositor da MPB do início do século XIX, grava seu primeiro disco.
Segundo Silva (1993), tanto a palavra samba quanto o gênero musical por ela referenciado na locução escola de samba possuem uma longa história e existem divergências com relação à sua origem: uns dizem que é oriunda do tupi, outros acreditam em uma formação onomatopaica; há os que preferem etimologias indígenas não tupis, porém a maioria admite ser de origem africana.
A origem africana da palavra, entretanto, parece indiscutível, de acordo com o princípio bem estabelecido e a cada dia comprovado de que o significante acompanha o significado, isto é, o nome acompanha a coisa. Sabe-se, com certeza, que as variantes regionais do gênero samba se encontram no Brasil, do Maranhão a São Paulo, em coincidência marcante com as regiões onde houve predominante introdução de negros bantos. Este fato, por si só, justificaria a aceitação de uma origem do termo samba não só africana, como ainda ligada a línguas do grupo banto. (SILVA, 1983, p.43).
Um novo tipo de agremiação carnavalesca: a escola de samba Estação Primeira foi criada por Cartola e seus companheiros. O papel de Cartola só pode ser avaliado compreendendo-se bem o que é o samba, pois foi a originalidade do estilo que construiu uma história.
Cartola também nos deixou um legado: faltando cerca de quatro dias para completar 67 anos, compôs As rosas não falam, que chegou a ser tema de novela da Rede Globo de Televisão. Nuno Veloso teria dado à esposa de Cartola, D. Zica umas mudas de roseira. Tempos depois, pela manhã, Zica, ao abrir a porta, ficou extasiada com a quantidade de rosas desabrochadas e perguntou a Cartola por que havia nascido tanta rosa assim, ao que ele respondeu que não sabia, pois “as rosas não falam”. Desde esse dia, a frase ficou na sua cabeça e ele pegou o violão e compôs a famosa canção.
Uma obra interessante a respeito da Música Popular Brasileira está escrita em inglês e resgata uma história da polca ao chorinho, de 1915 a 2005. Albin (2006) relembra Chiquinha Gonzaga, autora da famosa marchinha do Carnaval brasileiro: Ô abre alas; os Irmãos Valença com o grande hit de sucesso: O teu cabelo não nega; Roberto Carlos; Erasmo Carlos; Chico Buarque; Caetano Veloso; Gonzaguinha; Raul Seixas, entre outros.
A popularização do rádio nas décadas de 1920 e 1930 veio dar um impulso à Música Popular Brasileira. Vários cantores e compositores se destacaram nessa época, como Ary Barroso, Lamartine Babo, Dorival Caymmi, Lupicínio Rodrigues e Noel Rosa. Outros grandes intérpretes da música popular brasileira surgiram nesse período: Carmen Miranda, Mário Reis e Francisco Alves.
De acordo com Câmara (1997, p. 9), a cidade do Recife é um lugar de nascimento ou morada de grandes figuras do cenário musical brasileiro como: Adelmar Tavares, Antônio Maria, Clídio Nigro, Eustórgio Wanderley, Felinho, Luiz Gonzaga, Irmãos Valença, Olegário Mariano, Nelson Ferreira, Samuel Campelo, Valdemar de Oliveira, com destaque ao imortal Capiba, Alceu Valença, Diná de Oliveira, Fernando Lobo, Guedes Peixoto entre outros. A obra de Câmara (1997) reúne informações biográficas e sobre a carreira de compositores pernambucanos, letristas e musicistas que se destacaram a partir da década de 1920, muitos deles conhecidos em todo o Brasil e até no exterior.
Um dos maiores representantes da música popular pernambucana é Lourenço da Fonseca Barbosa, o Capiba, que nasceu na cidade de Surubim, no dia 28 de outubro de 1904. Segundo Câmara (1997, p. 27), suas composições abrangem vários gêneros que vão desde as valsas, as canções e os frevos, passando pelas serestas e guarânias. A partir de 1934, estourou nos Carnavais pernambucanos com a composição: “É de Amargar”. Musicou versos de vários nomes da poesia brasileira, como Carlos Drummond de Andrade, Vinícius de Moraes, João Cabral de Melo Neto, Ariano Suassuna, entre outros. Uma de suas mais conhecidas canções, que se perpetua de Carnaval a Carnaval, é: Oh Bela!:
Você diz que ela é bela,
Ela é bela, sim senhor.
Porém poderia ser mais bela
Se ela tivesse o meu amor.
Bela é toda natureza, oh! bela,
Bela é tudo que é belo.
O perfume de uma rosa,
O sorriso da criança,
O que fica na lembrança.
Bela é ver o passarinho, oh! bela,
Indo em busca do seu ninho, oh! bela.
Todo mundo se amando
Com amor e com carinho
Uns chorando e outros sorrindo de amor.
O Nordeste também foi bem representado na década de 1940 por Luiz Gonzaga, o "Rei do Baião", trazendo músicas de sucesso como Asa Branca.
Ainda nos anos 1940, outro ritmo teve destaque no contexto musical brasileiro: o samba-canção, no qual as canções falavam principalmente de amor. Foi quando surgiram Dolores Duran, Antônio Maria, Marlene, Emilinha Borba, Dalva de Oliveira, Ângela Maria e Caubi Peixoto.
Na década de 1950, surgiu um estilo musical suave e sofisticado: a Bossa Nova, que fez grande sucesso e conquistou outros países, principalmente os Estados Unidos. Destacando nesse cenário: Elizeth Cardoso, Tom Jobim e João Gilberto.
Um detalhe curioso nas canções populares é a presença da bebida alcoólica nas letras. Câmara (2009, p. 11) afirma que a bebida e o ato de beber sempre estiveram presentes na poesia da Música Popular Brasileira. As decepções amorosas, os sucessos, os fracassos e tantas outras razões alegres ou tristes sempre foram motivo para beber e, por isso, serviu de inspiração para alguns sucessos da MPB.
O ato de beber e o tipo de bebida a escolher criaram um verdadeiro partido político em defesa da mais popular a famosa branquinha (a cachaça), mas alguns compositores advertiam em suas músicas quanto a seu uso e a sua importância na vida do bebedor, senão vejamos a letra da marcha carnavalesca carioca Cachaça, de 1953, sucesso no Carnaval brasileiro de várias décadas, criação dos compositores Mirabeau/ Lúcio de Castro/ Heber Lobato/ Trigueiros Filho. (CÂMARA, 2009, p. 19).
Você pensa que cachaça é água
Cachaça não é água não
Cachaça vem do alambique
E água vem do ribeirão
Pode me faltar tudo na vida
Arroz, feijão e pão
Pode me faltar manteiga
E tudo mais não faz falta não
Pode me faltar o amor
Disso eu até acho graça
Só não quero que me falte
A danada da cachaça.
Quando a televisão se popularizou na metade da década de 1960, a TV Record organizou o Festival de Música Popular Brasileira onde foram lançados vários nomes importantes: Milton Nascimento, Elis Regina, Chico Buarque de Holanda, Caetano Veloso e Edu Lobo. No mesmo período, de acordo com Silva (2015?) a TV Record lançou o programa musical Jovem Guarda, no qual despontaram os cantores Roberto Carlos e Erasmo Carlos e a cantora Wanderléa.
Caetano em entrevista à Revista Civilização Brasileira, durante a mesa- redonda Que caminhos seguir na música popular brasileira, coordenada pelo músico Airton Lima Barbosa, em maio de 1966, fez uma declaração em que traça a “linha evolutiva” da Música Popular Brasileira do samba à Bossa Nova. Cícero (2002, p. 82), analisando o que disse Caetano e tendo em conta o início do Tropicalismo, em 1967, sugere que a partir daí, de acordo com essa linha de pensamento, os três pontos entre os quais a linha da evolução da MPB foi traçada seriam: o samba, a Bossa Nova e o Tropicalismo e a mesma poderia “projetar-se indefinidamente além do Tropicalismo, rumo a uma séria futura e ainda indefinida de pontos consecutivos”. Na verdade, como o Brasil possui uma enorme riqueza e diversidade musical, outras linhas evolutivas poderiam ser consideradas passando pelo frevo e baião, por exemplo. É inegável, porém, o fato de que o samba e a Bossa Nova, que é descendente dele, marcaram o início do sucesso da MPB.
Fenerick (2007, p. 84), observando a contradição latente na criação da Música Popular Brasileira, afirma que, “no Brasil, a música popular — que se tornou um dos eixos principais da vida cultural nacional — é fruto de uma modernização compulsória (e excludente) que se chocou brutalmente com uma sociedade de bases tradicionais, resultando num processo doloroso e complexo de escolhas, sempre pendulares, entre as incertezas provocadas pela modernidade e a permanência de certas tradições, a serem continuamente reinventadas”.
A década de 1970 marcou o aparecimento de vários músicos de sucesso: Nara Leão gravando músicas de Cartola e Nelson do Cavaquinho; Gal Costa e Maria Bethânia, vindas da Bahia; Djavan, vindo de Alagoas; Fafá de Belém, vinda do Pará; Clara Nunes, vinda de Minas Gerais; Belchior e Fagner, vindos do Ceará; Alceu Valença, vindo de Pernambuco; e Elba Ramalho, vinda da Paraíba.
Raul Seixas e Rita Lee marcaram o cenário do rock brasileiro ainda na década de 1970, quando também aparecem no cenário funk Tim Maia e Jorge Ben Jor.
Novos estilos musicais apareceram nas décadas de 1980 e 1990 com influência do exterior: o rock, o punk e a new wave.
Nos anos 1980, o país passava por grandes transformações e, após a ditadura militar, caminhava rumo à democracia. Em 1985, Roberto Medina realizou um dos maiores festivais do mundo: o Rock in Rio. A partir de então, o Brasil entrou para o cenário de grandes shows mundiais, era o primeiro país da América Latina a sediar um festival de música dessa grandeza. Aconteceu na cidade do Rio de Janeiro, como o próprio nome sugere, no bairro de Jacarepaguá, em uma área de 250 mil metros quadrados. O espaço recebeu, durante 10 dias, cerca de 1.380.000 pessoas.
A primeira edição do festival contou com vários nomes internacionais como Queen, AC/DC, James Taylor, George Benson, Rod Stewart, Yes, Ozzy Osbourne e Iron Maiden bem como estrelas nacionais como Ivan Lins, Pepeu Gomes, Rita Lee, Elba Ramalho, Paralamas do Sucesso, Blitz, Kid Abelha e Barão Vermelho.
Os anos 1990 foram marcados por diversos acontecimentos na vida dos brasileiros, como a conquista da Copa do Mundo e a morte de Ayrton Senna, em 1994. No que diz respeito ao setor musical, nessa época, o pop perdeu força para o surgimento do hip hop, rapcore (Eminem) e, principalmente, o grunge. As bandas mais conhecidas que marcaram o período são: Nirvana, Red Hot Chili Peppers, Pearl Jam e Foo Fighters. No cenário brasileiro, o sertanejo saiu do interior e ganhou destaque nas rádios nacionais com Chitãozinho & Xororó, Zezé Di Camargo & Luciano, Leandro & Leonardo e João Paulo e Daniel. Também se destacaram no cenário rap: Gabriel, o Pensador, O Rappa, Planet Hemp, Racionais MCs e Pavilhão 9.
No século XXI, apareceram grupos de rock com temáticas voltadas para o público jovem como Charlie Brown Jr, Skank, Detonautas e CPM 22.
Curiosidades:
- A música Carinhoso foi feita em 1917 por Alfredo da Rocha Viana Filho (Pixinguinha), então com 20 anos, que a manteve inédita por mais de uma década, sendo gravada apenas instrumentalmente em 1928. Em 1936, Carlos Alberto Ferreira Braga (João de Barro ou Braguinha) escreveu a letra. A canção foi gravada mais de duzentas vezes desde seu surgimento em 28 de maio de 1937, cantada por Orlando Silva, o Cantor das Multidões.
- Na primeira edição do Rock in Rio, em 1985, Freddie Mercury (Queen) regeu, imitando um maestro, o coro espontâneo do público durante o hit Love Of My Life.
Recife, 16 de fevereiro de 2016.
Fontes consultadas
ALBIN, Ricardo Cravo. MPB: a synthesis of the Brazilian soul: 1915-2005. [S.l.]: Price Water House Coopers, [2005?].
CÂMARA, Renato Phaelante da. Beber ou não beber: um panorama etílico na MPB: coletânea musical. Recife: Bagaço, 2009.
CÂMARA, Renato Phaelante da. MPB: compositores pernambucanos: coletânea bio-músico-fonográfica, 1920-1995. Recife: Fundaj, Editora Massangana, 1997.
CARVALHO, Herbert. A MPB canta e conta nossa história. Problemas Brasileiros, a. 45, n. 385, p. 28-32, jan./fev. 2008.
CÍCERO, Antônio. Música: o Tropicalismo e a MPB. Continente, a. 2, n. 21, p. 80-89, set. 2002.
FENERICK, José Adriano. Samba: tradição e modernidade na música popular brasileira. Resgate: Revista Interdisciplinar de Cultura, Campinas, n. 16, p. 83-94, 2007.
MPB [Foto neste texto]. Disponível em: <https://www.ighb.org.br/single-post/2017/09/14/IGHB-promove-curso-gratuito-sobre-a-Hist%C3%B3ria-da-MPB>. Acesso em: 07 ago. 2019.
SILVA, Marília T. Barboza da; OLIVEIRA FILHO, Arthur L. de. Cartola: os tempos idos. Rio de Janeiro: FUNARTE; INM; DMP, 1983.
SILVA, Raul Correa da. MPB: versos para sua prosa. São Paulo: Degustar, 2004.
Como citar este texto
VERARDI, Cláudia Albuquerque. Música Popular Brasileira: MPB. In: PESQUISA Escolar. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2016. Disponível em:. Acesso em: dia mês ano. (Ex.: 6 ago. 2020.)