Fundada em 1914, na cidade de Belém, Pará, pelo pernambucano Francisco Rodrigues Lopes (Olinda, PE, 1883 – Belém, 1947), a Editora Guajarina foi uma das maiores e mais conhecidas folhetarias dedicadas à chamada literatura sertaneja no Brasil.
Operário gráfico na capital do Pará, Francisco Lopes instalou uma tipografia e iniciou um processo de agenciamento de editoras do Nordeste que trabalhavam com literatura de cordel e com o cancioneiro popular.
Entre os anos de 1870 e 1910, houve uma grande migração de nordestinos para a região Norte do País. Fugindo da seca, buscavam enriquecer com a extração do látex (matéria prima da borracha) nos seringais. Levavam consigo sua cultura e tradições, como a literatura de cordel, expandindo dessa forma a tradição oral pela região amazônica, principalmente na chamada zona bragantina, no Pará.
Muitos nordestinos se radicaram também nas capitais Belém e Manaus, formando verdadeiros bairros, como os dos alagoanos e dos cearenses, o que propiciava um bom mercado consumidor de literatura popular.
A Guajarina editava, além de folhetos de cordel, livros de orações, pequenas narrativas em prosa e também alguns periódicos, entre os quais O Martelo, um jornal crítico-humorístico; O Mondrongo, também humorístico, e a revista quinzenal Guajarina, lançada em 1º de fevereiro de 1919.
No seu editorial de apresentação, intitulado Em vez de profissão de fé...a Guajarina destaca:
[...] Entre um sorriso e uma ironia, verão sempre a “Guajarina”, elegante, delicada, inofensiva.
O nosso título é singelo e fácil, o nosso fim alegre e bom.
Seremos, no torvelinho desta vida agitada e frívola de cidade, o periódico moderno, leve, galante, fino, esvoaçante, brejeiro que, num afã bisbilhoteiro incansável, tudo vê, tudo escuta, tudo diz... Um zumbido suave de vespa, uma alfinetada inofensiva, um olhar indiscreto talvez.
E lá se vai a figurinha delicada da “Guajarina”, que entra no salão, passeia na avenida, freqüenta o cinema, aparece nos teatros, anda nos bondes...
[...] E assim lá irá a “Guajarina”, de quinzena em quinzena, gozando o aconchego macio das mãos patrícias da mulher paraense.[...] (SALLES, 1971, p. 88-89).
A revista publicava e distribuía um suplemento intitulado Modinhas, em formato de folheto de cordel, com oito páginas, contendo letras de canções populares, muito em voga na época.
A Editora Guajarina teve grande aceitação e fez sucesso publicando folhetos de cordel de poetas famosos – como os paraibanos Leandro Gomes de Barros e João Martins de Atahyde, Firmino Teixeira do Amaral e Tadeu Serpa Martins – nem sempre com a autorização dos autores, assim como de poetas paraenses conhecidos pelos seus pseudônimos, a exemplo de Zé Vicente (Lindolfo Mesquita); Ernesto Vera (Ernani Vieira), Mangerona-Assu (Romeu Mariz) e Arinos de Belém (José Esteves).
No início, os folhetos de cordel eram publicados, quinzenalmente, como suplemento da revista Guajarina. Posteriormente, devido à grande demanda do mercado, a editora passou a publicar dois ou três por semana.
Além da temática nordestina, principalmente histórias sobre Lampião, Antônio Silvino, o cangaço, Padre Cícero e muitas pelejas, os folhetos abordavam temas locais como o Círio de Nazaré, a vida do seringueiro, crimes de grande repercussão, assim como temas nacionais e internacionais, onde se destacam a Revolução de 1930, o Estado Novo, e a Segunda Guerra Mundial, constituindo-se em uma fonte de informação popular importante, principalmente para aqueles que não tinham acesso ao jornal e ao rádio.
Localizada em Belém – onde os folhetos podiam ser comprados na sede da Editora, no Mercado Ver-o-Peso, na Praça Pedro II ou nas feiras de São Braz e da Marambaia – a Guajarina possuía uma grande rede de revendedores em cidades do interior paraense como Marabá, Santarém, Óbidos e Bragança; em Manaus; Rio Branco e Chapuri, no Acre, e em diversas cidades do Nordeste brasileiro, entre as quais São Luís, Caxias, Amarante e Icatu, no Maranhão; Teresina e Parnaíba, no Piauí; Fortaleza e Juazeiro do Norte, no Ceará; Natal, no Rio Grande do Norte e Campina Grande, na Paraíba.
Apesar de não se dedicar exclusivamente ao gênero, a maioria de seus lançamentos era de literatura popular em verso, em forma de desafios, narrações, contos, aventuras, fatos, romancetes, novelas e pelejas. Durante 22 anos, de 1920 a 1942, a Guajarina publicou 846 folhetos (SALLES, 1971, p. 92). Publicava também almanaques, orações e novenários, rótulos xilográficos e cantorias.
Além dos folhetos, lançou diversas coleções como a série Ao Som da Lyra (modinhas e canções brasileiras, 1929); Cancioneiro do Norte (1929 e 1936); O Trovador, nove volumes contendo novidades musicais da época (1929 a 1935); Lyra do Cantor (1932 a 1938); O Violão (1932) e a série Cantor Brasileiro (1938 a 1946).
A Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945) e a consequente restrição para a compra de papel causou-lhe grandes dificuldades, restringindo suas atividades e tornando irregular a publicação dos folhetos.
Mesmo assim, em 1946, publicou uma nova série intitulada Serenata. Nos carnavais desse mesmo ano e no de 1947, editou vários folhetos contendo o repertório musical da época.
Em 1947, com a morte do seu fundador, Francisco Lopes, a Guajarina foi adquirida por N. A. Souza, que deu continuidade a algumas séries de folhetos, mas em 1949, a editora encerrou as atividades, sendo suas instalações gráficas incorporadas à Livraria Vitória, de Raimundo Saraiva Freitas, que não publicou mais folheto.
Recife, 11 de outubro de 2012.
Fontes consultadas
CARVALHO, Gilmar de. Tramas da cultura: comunicação e tradição. Fortaleza: Museu do Ceará, 2005.
MENEZES NETO, Geraldo Magella de. A literatura de cordel no Pará. Disponível em: . Acesso em: 23 ago. 2012.
MENEZES NETO, Geraldo Magella de. Folhetos de cordel, meio de comunicação no Pará na primeira metade do século XX, março de 2012. Disponível em: . Acesso em: 24 ago. 2012.
SALLES, Vicente. Guajarina, folhetaria de Francisco Lopes. Revista Brasileira de Cultura, n. 9. p. 87-102, jul./set. 1971.
Como citar este texto
GASPAR, Lúcia. Editora Guajarina. In: Pesquisa Escolar. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2012. Disponível em: https://pesquisaescolar.fundaj.gov.br/pt-br/artigo/editora-guajarina/. Acesso em: dia mês ano. (Ex.: 6 ago. 2020.)