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Noite dos Tambores Silenciosos

É uma cerimônia de origem africana que reúne nações de maracatus de baque-virado, procedentes de todo o estado de Pernambuco,

Noite dos Tambores Silenciosos

Artigo disponível em: ENG ESP

Última atualização: 19/09/2022

Por: Maria do Carmo Gomes de Andrade - Bibliotecária da Fundação Joaquim Nabuco - Especialista em Biblioteconomia

A Noite dos Tambores Silenciosos é uma cerimônia de origem africana que reúne nações de maracatus de baque-virado, procedentes de todo o estado de Pernambuco, com a finalidade de louvar a Virgem do Rosário, padroeira dos negros, e reverenciar os ancestrais africanos, que sofreram durante a escravidão no Brasil Colonial.

Os ritos de reverência aos antepassados é um costume que os escravos trouxeram para o Brasil, como na cerimônia de Coroação do Congo, onde elegiam seus reis e rainhas, lamentavam seus mortos e pediam proteção aos Orixás.

No Brasil, os negros privados de sua liberdade não podiam manifestar suas crenças e tradições. Realizavam então cortejos de lamentações às escondidas e em silêncio, dando origem mais tarde ao nome da celebração: Noite dos Tambores Silenciosos.

Mesmo depois da abolição da escravatura, esse ritual continuou a ser realizado. Com o passar do tempo, todas as comunidades negras do Recife foram se agregando, o evento sempre foi realizado às segundas-feiras, dia das almas nas religiões de origem africana.

Essa festa de evocação e reverência era realizada no pátio da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, localizada na Rua Estreita do Rosário, no bairro de Santo Antonio. Entretanto, em 1965, por iniciativa do sociólogo e jornalista Paulo Viana, deu-se início a uma campanha de valorização e resgate dos ritos africanos, que durante o período da ditadura militar entrou em decadência, pois o número de participantes desse tipo de evento foi bastante reduzido devido às perseguições políticas.

Assim, foi criada a Noite dos Tambores Silenciosos, que tem início com a leitura do poema Lamento Negro por Paulo Viana, no Pátio da Igreja de Nossa Senhora do Terço ou Pátio do Terço como é mais conhecido, no bairro de São José, musicada pelo compositor João Santiago, em memória dos escravos que nunca tiveram direito de brincar o carnaval, motivo pelo qual o evento era sempre realizado nessa época.

Em 1968, a Noite dos Tambores Silenciosos passou a ser realizada no Pátio do Terço, lugar onde tradicionalmente aconteciam as festividades afro descendentes. Hoje, o ritual é destaque no carnaval pernambucano, faz parte do calendário das festividades de Momo, sendo prestigiado por foliões, curiosos e turistas de toda parte do Brasil e até do exterior.

A cerimônia começa com a apresentação dos maracatus de baque-virado, que são considerados nações (raça, espécie, casta de gente ou coisa) africanas. O tambor tem lugar de destaque nesse evento. Segundo Valente (1952-1956), o tambor é considerado o principal instrumento da orquestra dos xangôs e tem uma função mágica nas religiões africanas. Sua sonoridade envolvente tem um poder hipnótico sobre adoradores de Orixás representando um elo mágico entre as criaturas humanas e as divindades, espécie de meio de comunicação entre o mundo material e o mundo espiritual dos Orixás.

À meia-noite o ritual chega ao auge quando as luzes do bairro de São José são apagadas e o público presente no pátio silencia. Tochas são acesas e levadas até a porta da Igreja pelos líderes dos maracatus. Uma voz entoa loas (verso de louvor, louvação em versos improvisados ou não) em louvor a Rainha dos negros, Nossa Senhora do Rosário. O silêncio é interrompido apenas pela batida intermitente dos tambores de todas as nações de maracatus, que entoam cânticos de Xangô (um dos mais populares, prestigiosos e divulgados orixás dos candomblés, terreiros, macumbas). A marcha dos dançarinos é marcada pela batida de tambores. Estandartes trazem o nome dos maracatus e são seguidos por uma corte de reis e rainhas africanas devidamente caracterizadas.

Nesse momento, o babalorixá responsável pelo ritual, alinha os batuques e rege um coro de mães-de-santo que rezam com ele, e termina o culto abençoando os membros dos maracatus e o público presente na cerimônia.

 

 

 

Recife, 23 de janeiro de 2009.
 

Fontes consultadas

CAMARA CASCUDO, Luis da. Dicionário do Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1954.

FAVALLI, Marcelo. Noite dos tambores Silenciosos mistura tradição afro com folia em Recife.Rabisco: Revista de Cultura POP, 13/26 mar. 2003. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/

carnaval/2006/ultnot/recife/2006/02/28/ult3486u16.jhtm>. Acesso em: 7  jan. 2009.

LIRA, Ana. Silêncio em homenagem aos ancestrais. Disponível em: <http://www.rabisco.com.br/14/tambores.htm>. Acesso em: 7 jan.2009.

PADRÃO, Márcio. A tradição dos tambores silenciosos. Gazeta do Nordeste, Recife, 2 mar.2000.

RITUAL afro leva maracatus ao Pátio do Terço. Jornal do Commercio, Recife, 26 fev. 2001. Carnaval.

VALENTE, Waldemar. A função mágica dos Tambores. Revista do Arquivo Público, Recife, ano 7/10, n. 9/12,  p. 81-89, 1952/1956.

Como citar este texto

ANDRADE, Maria do Carmo. Noite dos Tambores Silenciosos. In: PESQUISA Escolar. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2009. Disponível em:https://pesquisaescolar.fundaj.gov.br/pt-br/artigo/noite-dos-tambores-silenciosos/. Acesso em: dia mês ano. (Ex.: 6 ago. 2020.)