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Carlos Ivan de Melo: dos andores das procissões às folias de momo em Olinda - PE

Data Nasc.:
20/07/1942

Data de falecimento.:
01/04/2021

Ocupação:
Artista Plástico


 

Carlos Ivan de Melo: dos andores das procissões às folias de momo em Olinda - PE

Artigo disponível em: ENG ESP

Última atualização: 01/03/2023

Por:
Rúbia Lóssio - Coordenação dos Estudos das Culturas Populares da Fundaj - Doutora em Sociologia

Olinda é uma das mais antigas cidades do Brasil. Fundada pelo português Duarte Coelho, que a transformou na capital da mais próspera capitania do Brasil Colonial, foi durante séculos o centro da aristocracia açucareira.
 
O ciclo da cana de açúcar trouxe para Olinda os grandes engenhos, com muita riqueza e refinamento, contribuindo para que a cidade criasse o primeiro curso de Ciências Jurídicas do Brasil.
 
A cidade, até os dias atuais, possui um clima repleto de discussões intelectuais e de um espírito de liberdade de pensamento. Ao mesmo tempo, o velho Burgo Duartino convive com os antigos mosteiros e velhas igrejas, construídos nas colinas e ornamentados pelas românticas e famosas ladeiras de onde se avista o mar azul que trouxe um dia as primeiras caravelas portuguesas.
 
Dizem os que nasceram nessa bucólica cidade que: “ser olindense é um estado de espírito”.
 
Além de abrigar em seu seio, artistas e poetas, a cidade apresenta todos os anos um dos mais animados carnavais do Brasil, onde os clarins de Momo anunciam a espontaneidade e a alegria contagiante de seus habitantes, misturando os sons dos instrumentos musicais dos blocos, troças, clubes carnavalescos, afoxés e maracatus aos sons dos sinos dos mosteiros e das velhas igrejas, deixando na alma de todos os que ali habitam a certeza que Dionísio e Apolo, convivem muito bem nessa cidade onde o Sagrado e o Profano a torna uma das mais democráticas e belas cidades da terra dos “brasis”. É neste cenário que nasceu e se multiplicou a obra de Carlinhos (como é tratado por seus amigos). Dicotômica e bela, religiosa e lúdica, Olinda é eterna (como disse Capiba), e com certeza Apolo, Euterpe, Tepsícore e Dionísio gostariam de terem nascido do Burgo Duartino se não tivessem nascido no Olimpo.
 
Hoje, Olinda é a primeira Capital Brasileira da Cultura. De acordo com Silva (2006, p. 35), a cidade também é toda carnaval, é só alegria nas ricas fantasias do povo. Como no frevo de Severino Luiz Araújo e Nelson Luiz Gusmão, “...é lindo o carnaval de Olinda / E quem não viu ainda/ Não sabe o que é paixão / A vida esquece a saudade / Tudo é felicidade / E amor no coração”.  Essa cidade possui o encanto e magia de um povo alegre e crítico que no período de carnaval são induzidos pelo êxtase da brincadeira que acontece nas famosas ladeiras estreitas, em suas paisagens de encontro ao mar, igrejas históricas entre a Rua do Amparo, Rua da Bica e no Alto da Sé. O Mosteiro de São Bento, Praça do Carmo, Praça do Jacaré, Varadouro entre outros fazem parte da beleza física e poética de Olinda. Cidade aconchegante e ladeada de praças, de colinas, do mar e de árvores é berço de vários artistas mostrarem o seu talento.
 

Hino do Elefante de Olinda (Composição: Clídio Nigro / Clóvis Vieira):

 

“ Olinda! Quero cantar a ti esta canção.
 Teus coqueirais, o teu sol, o teu mar.
 Faz vibrar meu coração, de amor a sonhar
 Em Olinda sem igual
 Salve o teu Carnaval!”

 

Sua paisagem resiste há vários séculos, onde ocorre um reencontro com o passado coberto de tradições explicado e enaltecido pelo poema de Carlos Pena Filho:

   

    “Olinda é só para os olhos,
     Não se apalpa, é só desejo.
     Ninguém diz: é lá que eu moro.
     Diz somente: é lá que eu vejo.

     Tem verdágua e não se sabe,
     a não ser quando se sai.
     Não porque antes se visse,
     Mas porque não se vê mais.
 
     As claras paisagens dormem
     No olhar, quando em existência.
     Diluídas, evaporadas,
     Só se reúnem na ausência.”

 

Nesse espaço arquitetônico de vibração e de euforia o artista plástico e carnavalesco Carlos Ivan de Melo, contribui com sua dedicação e perfeição em seus trabalhos ricos em criatividade que exalta o belo.
 

Carlos Ivan de Melo nasceu na cidade de Olinda, Rua Coronel João Lopes, antigo “Beco da Poeira”, nos arredores do Varadouro. É filho de dona Antônia da Paz Vieira de Melo e do senhor Manoel Vieira de Melo. Durante sua infância apreciava com admiração os trabalhos de sua tia Julinha, senhora prendada nas artes da costura e da decoração. Também observava a criatividade dos artistas ao seu redor. A sua faculdade foi à cidade que lhe serviu de berço e seus professores de arte os artistas ao seu redor. Aos poucos foi adquirindo sua própria linguagem, seu jeito de fazer arte, unindo uma fantástica criatividade a um estilo refinado e aristocrático. Viajou e conheceu outras terras, principalmente várias vezes a Portugal onde foi várias vezes, inclusive para apresentar trabalhos tais como o “Grupo de Canto e Dança de Olinda”.
 
A professora Cirinéia conheceu Carlos Ivan e sua esposa Sílvia Melo, (de saudosa memória), em uma apresentação no clube Atlântico, berço de tantos momentos marcantes do povo olindense. O que chamou atenção em seus trabalhos entre a sua religiosidade e envolvimento com os movimentos da igreja católica romana, sua paixão pelo carnaval e principalmente sua extraordinária memória. Carlos Ivan lembra fatos, músicas e brincadeiras do passado olindense com riqueza de detalhes.
 
Este amor e admiração pelo passado de Olinda fizeram-lhe realizar durante alguns anos o “Baile das Sinhazinhas”, todo a caráter, com os jovens da sociedade de Olinda, onde reviveu os velhos saraus de sua amada cidade. Para explicar sua paixão pela música Carlos Ivan recorda que em Olinda toda música tinha uma história.
 
Foi assim com a música Banho de Conde de autoria de Clídio Nigro e Wilson Wanderley. No Informativo para Escolas - Frevo e Maracatu, Carnaval de 1994, Organizado por Iracema Lima Pires Ferreira revela que “Essa composição do antigo carnaval de Olinda, com sentido alusivo ao Senhor Ficher, o ‘bloco Guaiamu na Vara’ denunciava um fracasso de seu principal concorrente ‘Batutas de Olinda’.”

 

Vou formar a turma
Pra tomar banho na beira do mar
Vou ficar molhado
Eu vou dar água pelo carnaval

Vem padroeiro “fiche”
Que, acendi no “painé”
Não mergulhei, mas me afoguei (BIS)
Banho de maré tomei

 

Sua obra também é encontrada nos andores e procissões de Olinda e Recife, como por exemplo, as procissões de Nossa Senhora do Carmo e N.Sra. Dos Passos (Recife) e as Procissões de Olinda, principalmente do Padroeiro da cidade, São Salvador do Mundo. As ornamentações de igrejas e outros ambientes realizados por este artista são reconhecidos pelo seu bom gosto e respeitadas por aqueles que entendem de beleza e refinamento.
 
Junto a toda essa produção, Carlos Ivan também se dedica ao carnaval de Olinda e Recife. Esse artista plástico é também um músico amador, um carnavalesco e também artesão, tendo criado várias fantasias e temas dos mais variados blocos e troças de Olinda e Recife, inclusive confeccionando seus estandartes. Foi carnavalesco da Pitombeira de Olinda e de muitos outros clubes e troças. Atualmente dedica-se ao Bloco da Saudade onde há treze anos desenvolve temas, os mais variados, e cria suas fantasias e seus bordados e adereços. Carlos Ivan de Melo merece o reconhecimento público de sua obra pelo muito que tem feito pela cultura pernambucana.
 
 
Recife, 2006 .

Fontes consultadas

CARLOS Ivan de Melo [Foto neste texto]. Disponível em: <https://www.diariodepernambuco.com.br/noticia/viver/2018/01/carlos-ivan-trata-carnaval-como-compromisso-sagrado.html>. Acesso em: 03 nov. 2019.
 
SILVA, Leonardo Dantas. VERAS, Luciana. A Primeira Capital Brasileira da Cultura – Olinda. Revista Continente Documento. Recife: CEPE, a. 4, n. 42, p. 1-35, 2006.

Como citar este texto

AMARAL, Cirinéa; LÓSSIO, Rúbia. Carlos Ivan de Melo: dos andores das procissões às folias de momo em Olinda-PE. Recife: Pesquisa Escolar. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2006. Disponível em:https://pesquisaescolar.fundaj.gov.br/pt-br/artigo/carlos-ivan-de-melo-dos-andores-das-procissoes-folias-de-momo-em-olinda-pe/. Acesso em: dia mês ano. (Ex.: 6 ago. 2020.)