Quem Vai Pra Farol É o Bonde de Olinda
Você diz que gosta de mim
Mas só pode ser brincadeira de berlinda
Por que você mente tanto assim?
Quem vai pra farol é o bonde de Olinda
Quem vai pra farol é o bonde de Olinda.
Você diz a todo mundo que é milionária
Mas só lhe vejo andando a pé
Essa mania de mentir, meu bem, não convém
Viaje ao menos no loré [bonde de segunda categoria]
Você diz que gosta de mim
Mas só pode ser brincadeira de berlinda
Por que você mente tanto assim?
Quem vai pra farol é o bonde de Olinda
Quem vai pra farol é o bonde de Olinda.
Você sabe que eu sei e todo mundo já fala
Porem você quer me ocultar
Confesse logo e deixe de pantim para mim
Que você vive a me enganar
Capiba
As obras de construção de uma estrada interligando o Recife à Olinda começaram em 1817, passando por Santo Amaro das Salinas, onde havia sido feito um aterro e cujo traçado, em linha reta, reduzia bastante o percurso. Devido aos conflitos resultantes da revolução de 1817, as obras foram abandonadas.
Em 1841, no governo de Francisco do Rego Barros, o Conde da Boa Vista (1837-1844), as obras foram retomadas, sob a responsabilidade do então engenheiro-chefe da Repartição de Obras Públicas de Pernambuco, Louis Lèger Vauthier, que também considerava importante que fosse construída uma estrada de ferro, ligando as duas cidades vizinhas.
O primeiro transporte coletivo existente no Recife foi a diligência. Puxada por quatro cavalos, às vezes com dois andares, era chamada também de ônibus.
Em 1847, esse tipo de transporte começou a circular entre o Recife e Olinda, após a conclusão da ponte da Tacaruna.
Concluídas as obras de prolongamento da estrada da Tacaruna até o Varadouro, um comerciante de pólvora, residente em Apipucos, Cláudio Dubeux, contratou, em 1855, os serviços de ônibus da capital para os subúrbios de Olinda, divulgando pelos jornais os horários e preços das passagens:
[...] haverá um ônibus para Olinda, em todos os dias úteis, o qual partirá para ali às 6 horas da manhã, e voltará às 7 a fim de se achar aqui às 8 da manhã e às 2 da tarde, sendo as passagens a 20$ mensais para os assinantes, e 500 rs. Para os avulsos.[...]
Em 1870, havia duas viagens de ida e duas de volta do ônibus que interligava as duas cidades, nos seguintes horários: 7h da manhã e 4h da tarde, idas do Recife para Olinda, voltando de Olinda às 8h30 da manhã e 5h30 da tarde.
Os ônibus fizeram o transporte entre as duas cidades até 1871, quando começaram a funcionar os trens da Companhia Trilhos Urbanos, com as famosas Maxambombas (corruptela do inglês machine pump, motor a bomba ou a sucção). Eram locomotivas a vapor (conhecidas como Maria Fumaça) com cabine descoberta, com dois ou três vagões, compostos de um ou dois pavimentos.
Os primeiros trens a vapor chegaram à Olinda no dia 24 de junho de 1870, ainda em tráfego provisório. Mário Sette, no seu livro Barcas de vapor, assim descreve o acontecimento:
[...] Em breve o Varadouro ouviu o “apito civilizador” da locomotiva. Grelaram os olhos para acreditar. Mas era uma realidade: a Maxambomba vinha direitinho desde o barracão da Rua da Aurora até a entrada do varadouro, e, logo depois, até o casarão de dois portões do pátio do Carmo. Aquilo sim é que era progresso! Em 24 horas viajaram 2.000 pessoas na Maxambomba. [...]. O povo acostumou-se logo com o trem. Mal o maquinista dava o apito de 5 minutos, cada um tratava logo de ir tomar seu banquinho predileto: no vão de grades ou no carro-salão. [...] Em compensação já existia quem implicasse com a fumaça da máquina... Esses talvez preferissem a canoa... São de todas as épocas...
A Companhia de Trilhos Urbanos do Recife a Olinda e Beberibe, na época contava com 13.273 km de extensão, dos quais 8.823 km era da linha para Olinda. Possuía seis locomotivas e trinta carros de passageiros, sendo dezoito de primeira classe, seis de segunda e seis de terceira.
O percurso do Recife até a estação do Varadouro poderia ser feito em aproximadamente trinta minutos. Posteriormente foi inaugurado o prolongamento até o pátio do Carmo, com os trilhos seguindo caminho paralelo ao mar.
A antiga estação Maxambomba, próxima ao Largo do Carmo, era o ponto de partida de uma linha que ia de Olinda até Boa Viagem, passando pela Estrada de Belém, Beberibe, Estrada Velha de Água Fria, Caxangá, Rua Imperial e Centro do Recife.
A partir de 1915, a ligação entre o Recife e Olinda passou a ser feita por meio de bondes movidos a tração elétrica, os chamados bondes elétricos. Transporte bom e barato, as viagens eram cômodas, alegres e divertidas. Durante o trajeto conversava-se; fazia-se negócio; discutia-se futebol, política, teatro e literatura; lia-se jornal, namorava-se e fazia-se amizade. Os veículos eram limpos, seguros e bonitos. Neles podia-se viajar com tranqüilidade.
Em 1916, os bondes da Companhia de Trilhos Urbanos do Recife a Olinda e Beberibe, tinham sua estação central na Rua da Aurora, nº 38. De lá partiam bondes para diversos bairros do Recife e um ramal que ia para a cidade de Olinda parando nas seguintes estações: Hipódromo, Campo Alegre, Campo Grande, Salgadinho, Duarte Coelho, Santa Tereza, Varadouro, Milagres e Carmo.
Com poucas linhas no início, os bondes elétricos ganharam rapidamente os subúrbios do Recife em todas as direções, assim como a linha para a cidade de Olinda, fazendo uma grande concorrência aos veículos de tração animal e às Maxambombas. Adquiridos pela firma Pernambuco Tramways Power and Company Limited, os pequenos trens da Companhia de Trilhos Urbanos do Recife a Olinda e Beberibe (depois Brazilian Street Railway Company), continuaram em atividade nos percursos mais longos, como os de Olinda, Beberibe e Dois Irmãos, até o início da década de 1920.
Após o encerramento das atividades das empresas responsáveis pelos bondes à tração animal e as Maxambombas, o bonde elétrico ficou absoluto no transporte público de massa no Recife e Olinda.
Um acordo entre a Prefeitura de Olinda e a Tramways, em 1927, possibilitou que os trilhos urbanos fossem deslocados para o centro da Avenida Sigismundo Gonçalves, com o objetivo de melhorar o trânsito local.
Em 1928, a Pernambuco Tramways foi adquirida por um grupo norte-americano, que manteve o mesmo nome e promoveu uma reforma nos veículos modernizando-os. Os bondes foram fechados e se tornaram mais aerodinâmicos, sendo apelidados pela população de Zeppelins, na época a grande sensação nos céus do mundo. No dia 7 de junho, foi inaugurada a linha do Farol de Olinda.
Havia dois tipos conhecidos o Zeppelin e o Cristaleira, cujas famas atravessaram fronteiras. O Zeppelin, considerado o mais bonito, era utilizado apenas na linha de Olinda, considerada a linha chic. Conduzia reboque, também fechado e do mesmo tamanho do carro-motor. O Cristaleira, fechado e envidraçado, circulava nas linhas de Olinda e do Espinheiro, no Recife. Ambos só transportavam passageiros que estivessem bem vestidos e calçados.
Em 1936, os bondes da linha Recife - Olinda tinham seu ponto de partida na Praça Rio Branco e após um percurso por ruas e pontes da cidade seguiam pela Av. Cruz Cabugá, percorrendo o seguinte itinerário em Olinda: Rua do Rosário, Rua Santos Dumont. Av. Sigismundo Gonçalves, Praça do Carmo, Rua do Sol e Avenida Rio Doce.
A partir da década de 1940, começou a haver o declínio do bonde como transporte público no Recife e em Olinda, até a sua total extinção nos meados da década de 1950.
O bonde 104 foi o único preservado, sendo exposto de início às margens do rio Capibaribe, na Rua da Aurora e, em 1985, doado à Fundação Joaquim Nabuco, onde se encontra em exposição nos jardins do Museu do Homem do Nordeste .
Recife, 11 de janeiro de 2011.
Fontes consultadas
ARAÚJO, Rita de Cássia Barbosa de. As praias e os dias: história social das praias do Recife e de Olinda. Recife: Prefeitura, Fundação de Cultura Cidade do Recife, 2007.
BONDES no Brasil: Recife/Pernambuco. Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/bonden03.htm>. Acesso em: 5 jan. 2011.
DE Olinda a Boa Viagem, nos trilhos. Disponível em: < <http://www.diariodepernambuco.com.br/2010/12/12/urbana13_1.asp>. Acesso em: 5 jan. 2011.
SANTOS, Dalvino. Olinda que eu conheci. Anuário de Olinda, Olinda, p. 24-25, 1961-1961
SETTE, Mário. Barcas de vapor: cenas do passado brasileiro. São Paulo: Edições Cultura, 1945.
SETTE, Mário. Transportes do Recife. Arquivos, Recife, ano 1, n.2, p. 125-143, nov. 1942.
TRÁFEGO urbano e suburbano: bondes. Annuario de Pernambuco para 1936: Suplemmento dos Diario da Manhã e Diario da Tarde, Recife, p.23, 1936.
Como citar este texto
GASPAR, Lúcia. Bondes de Olinda. In: PESQUISA Escolar. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 2011. Disponível em:https://pesquisaescolar.fundaj.gov.br/pt-br/artigo/bondes-de-olinda/. Acesso em: dia mês ano. (Ex.: 6 ago. 2020.)